Um crime bárbaro e com requintes de crueldade, cometido no último dia 14 (domingo), abalou a cidade de Poço Fundo e chamou a atenção de todo o Sul de Minas: o atentado promovido pelo ex-presidiário Cristian de Souza (34 anos), vulgo “Kito”, contra a sua ex-companheira Iza Kevelyn Flora de Souza (25 anos), que resultou na morte dela dias depois. A vítima já havia publicado diversas mensagens em redes sociais alegando que estava sendo ameaçada. No entanto, dispensou as medidas protetivas oferecidas pela Polícia. O autor fugiu após o ato e ainda está foragido. As diligências e investigações para detê-lo continuam.
Tudo começou na noite do dia 14, quando Iza Kevelyn chegou à residência em que estava morando, pertencente ao amigo Laércio de Souza (54), situada na Rua Etelvina de Oliveira, no bairro São José (Canto). Ao adentrar o imóvel, ela foi surpreendida por Cristian, que estava escondido no alpendre. Então, o rapaz agarrou a vítima e a levou para um quarto, onde sacou uma garrafa pet pequena contendo gasolina e incendiou tudo. “O Cristian estava escondido aqui dentro. Assim que a Iza entrou, ele a pegou e os dois foram para o quarto. Foram uns dez minutos de silêncio. Aí, começaram os gritos. Naquele instante, corri e abri a porta. A garota passou a me chamar pelo nome, implorando por socorro. Quando cheguei na entrada do cômodo, o Kito estava com um litro e jogou um líquido no rosto dela. Depois, já mandou o fogo, não sei se com isqueiro ou palito de fósforo. Foi instantâneo, deu uma explosão na cara dela e começou a queimar. Naquele momento, só vi as chamas. Não sabia se acudia ela ou se corria atrás do rapaz. Optei por socorrer a menina, mas o combustível queimando não me deixava chegar até ela. Estiquei o braço e, a hora que a peguei, o couro estava saindo. A gasolina que estava no corpo dela ainda escorreu na minha mão e pegou fogo, me queimando”, lembra o dono da casa, Laércio.
Após ser colocada para fora do cômodo, a moça foi para a rua pedir socorro e recebeu a ajuda de diversos vizinhos, que a encaminharam ao Hospital de Gimirim. Ela deu entrada na unidade de saúde com 54% do corpo queimado, inclusive todo o cabelo.
Ao chegar no local, a Polícia Militar ouviu relatos de testemunhas que Cristian estaria ameaçando Iza Kevelyn há um bom tempo, devido ao fato de não aceitar o término do relacionamento amoroso que tinham. Então, a Guarnição saiu em rastreamento, com intuito de encontrar o autor.
De posse de algumas denúncias feitas, os policiais seguiram para a residência da avó do rapaz. Ao visualizar a viatura, ele fugiu pelos fundos do imóvel, tomando rumo ignorado. Buscas foram feitas na região, mas sem sucesso.
O acontecido foi comunicado ao delegado de plantão, Cleovaldo Pereira, que dispensou os trabalhos da Perícia, alegando que os mesmos seriam promovidos posteriormente.
O caso foi registrado em Boletim de Ocorrência e encaminhado à Delegacia de Poço Fundo para as demais providências.
Cristian, que deverá ser enquadrado por crime de feminicidio, podendo pegar de 12 a 30 anos de cadeia se for detido e condenado, continua desaparecido.
Qualquer informação que leve ao seu paradeiro pode ser repassada pelos telefones 190 e (35) 98879-7176, da Polícia Militar, ou 181 (Disque-denúncias) e (35) 3283-1236, da Polícia Civil. Sua identidade será mantida em sigilo.
A morte
Um dia após dar entrada no Hospital de Gimirim e devido ao quadro gravíssimo que apresentava, Iza Kevelyn teve que ser transferida para outra unidade de saúde especializada no assunto.
Então, contatos passaram a ser feitos com representantes do João XXIII, em Belo Horizonte, a fim de obter uma vaga para a jovem. Porém, até conseguir a autorização, a garota seguiu para o Alzira Vellano, em Alfenas, numa espécie de ponte, para receber tratamentos mais específicos e estabilizar a sua situação.
No entanto, antes mesmo do encaminhamento sair para a entidade da capital mineira, Iza sofreu um mal súbito e veio a óbito. “Os médicos iam transferi-la para Belo Horizonte, para um hospital de queimaduras, mas, infelizmente, deu uma parada cardíaca e o coração dela parou. Não conseguiram fazer a Iza reagir”, revelou a mãe da vítima, Sílvia Helena (43).
O sepultamento de Iza Kevelyn aconteceu no dia 16 (terça-feira), no Cemitério de Poço Fundo. A moça deixou duas filhas, de 4 e 7 anos de idade.
Ameaças
Durante as apurações feitas pela reportagem do JPF sobre a morte de Iza Kevelyn, pessoas ligadas à menina afirmaram que o relacionamento com o ex-companheiro sempre foi cheio de problemas. “A Iza e o Kito tiveram um namoro que durou cerca de um ano. No início foi meio conturbado. O rapaz estava cumprindo pena há mais de dez anos, no Presídio de Três Corações, por tráfico de drogas. E foi nessa época, por telefone, que eles começaram a se relacionar. Só sei que um dia encontrei com ela, que estava ao celular. Aí, perguntei com quem estava conversando e me respondeu que era com fulano de tal. A aconselhei a largar mão daquilo, que o cara não daria futuro, pois, se estava preso é porque alguma coisa de grave tinha. Porém, ela alegou que ‘não dava nada não’ e continuou o papo. Passou um tempo, o Kito saiu e a Iza arrumou um táxi para ir a Três Corações buscá-lo. Daí, iniciaram a relação estável, que passou por muitos momentos ruins e acabou nisso”, contou uma amiga da vítima, que pediu para não ser identificada.
Ainda conforme familiares, Cristian sempre foi violento e já a intimidava há um bom tempo por não aceitar o fim do relacionamento. Alertas de que temia pela própria vida foram feitos pela garota via internet. “Depois de meses de namoro, o Kito ficou agressivo e começou a bater em Iza, a espancá-la, inclusive, na frente das filhas. Ele também a trancava e não a deixava ir à minha casa, ao supermercado ou a qualquer lugar. É um psicopata. Devido a isso, nos últimos dias, Iza tinha desabafado numa rede social, escrevendo sobre as constantes ameaças que vinha sofrendo de Cristian. Ele vivia falando que ia matá-la e, em seguida, suicidar. Ele foi até a residência dela e picou as calcinhas, as roupas das meninas, e jogou água no computador para estragar. Daí, uma semana antes disso acontecer, a Iza utilizou novamente a internet para registrar que Kito estava fazendo ameaças com faca e chegou até a agredi-la. No texto, Iza disse ainda que estava com medo e queria justiça, antes que o ex-companheiro a matasse. Ele estava escondido, sondando o dia a dia dela, e deu nisso aí”, relatou a genitora da vítima.
Familiares da jovem esperam que Cristian seja encontrado e pague pelo crime que cometeu. “Uma pessoa que faz isso com uma mulher, vai arrumar outra e agir do mesmo jeito. Ele é aquele tipo de homem possessivo, acha que só existe uma mulher na face da terra e tem que ser dele”, ressaltou Sílvia.
Investigações
Devido à fuga do suspeito, o JPF também procurou o delegado Éder Neves para apurar como andam os trabalhos de investigação acerca do caso.
Primeiramente, o chefe da Polícia Civil gimirinense fez questão ressaltar que Cristian é perigoso. “Ele é um homem com elevado índice de periculosidade. Analisando a folha de antecedentes criminais do acusado, nota-se registros por tentativas de homicídios, roubos, furtos, lesão corporal, tráfico de drogas, dentre outros. Além disso, aparenta ser uma pessoa completamente ciumenta e possessiva.
Ainda segundo o delegado, há cerca de um mês, Iza, cansada de ser agredida e de sofrer ameaças de Kito, pediu ajuda à mãe e procurou a Polícia Civil para registrar diversos Boletins de Ocorrência contra o ex-companheiro. No entanto, por várias vezes, dizendo acreditar no amor, dava uma nova chance a Cristian e retirava as queixas que tinha contra ele na Polícia. “Essa Delegacia já havia instaurado um inquérito policial sobre os envolvidos, e, em depoimento, Iza negou que havia sido agredida. Inclusive, ela recusou medidas protetivas de urgência no final do ano passado. Mas, perante o caso da morte da menina após uma surra proferida pelo rapaz, podemos entender que houve um feminicidio. Já representamos junto ao Poder Judiciário pela decretação da prisão preventiva do acusado e as apurações continuam, a princípio, com a finalidade de localizar o mesmo. Se for detido, ele passará por julgamento e poderá pegar até trinta anos de cadeia”.